considerações sobre design de objetos

Historicamente, segundo Giulio Carlo Argan (2000), existem diferenças entre a arte contemplativa e a arte aplicada, sendo esta última entendida como o modo tradicional de produção dos objetos. A relação entre estas artes não é caracterizada por uma separação. Existe uma relação entre essas artes que é o modo como apresentam a sociedade e o mundo que idealizaram para si: “a arte chamada pura transmite uma imagem do mundo, a arte assim chamada aplicada transmite uma imagem da sociedade e de seus valores internos e sobretudo das suas funções.”

Produzidos dessa forma, os objetos são, além de exemplos de mundos, mediadores da ação do homem; estão inseridos como objetos propriamente ditos na realidade “e a modificam, a recriam continuamente, tal como continuamente se transforma e se recria a estrutura do corpo social” (Argan, 2000).

Jean Baudrillard (1973) elucida ainda melhor como ocorre essa experiência entre objetos, sujeito e espaço. Os objetos formam um sistema que só pode ser reconhecido quando recorre a um vocabulário do cotidiano, da história, do mundo, sistema esse que corresponde a um horizonte que é espaço. Segundo Baudrillard, uma relação antropomórfica circunscreve o objeto, pois o homem acha-se ligado aos objetos de um ambiente pela mesma intimidade visceral que aos órgãos do próprio corpo.

Nessa última década, as relações sociais e comerciais migraram da lógica do consumo de utilidade para a do desejo, fazendo símbolos tornarem-se mais importantes do que nunca em nossas vidas. Hoje, marcas constroem e representam o estilo de vida de grupos e de suas identidades sociais, funcionando como seus identificadores.

As escolhas de determinados objetos refletem nossas preferências, valores e estilo de vida. Desta maneira, percebe-se que:

"as pessoas estão submersas pelos seus objetos – sejam eles de uso pessoal, decorativos, belos, feios, ordinários ou raros; e não se pode evitar ver as pistas que eles deixam de suas identidades. Pistas sobre cultura, identidade nacional, ideologia política, afiliação religiosa ou inclinação sexual, os objetos refletem quem são ou quem os donos desejam ser." (Mustienes, 2000)

O design vem buscando resolver as relações humanas com os objetos e espaços e promover uma interação mais produtiva e rica entre o homem e seu meio: de utensílios, ferramentas, roupas, móveis, carros e computadores a projetos gráficos e de comunicação para meios impressos e digitais ou interfaces interativas.

Já se apresenta de forma tão consolidada na sociedade contemporânea que é possível nem perceber sua presença. Essa onipresença do design subestima sua influência no dia-a-dia, mas basta olhar em volta para perceber como o mundo passou a ser permeado por sua existência e a depender dele.

mas o que é design?

São muitas as definições existentes sobre a palavra design, como também é infinitamente variada e, portanto, difícil de resumir a natureza exata desse processo. Redig (1977) adota o termo desenho industrial como aquele que identifica a atividade design. Segundo esse autor,

desenho industrial (design) é o equacionamento simultâneo de fatores ergonômicos, perceptivos, antropológicos, tecnológicos, econômicos e ecológicos, no projeto dos elementos e estruturas físicas necessárias à vida, ao bem-estar, e/ou à cultura do homem. (Redig, 1977: p.32)

O que pode ser afirmado é que a produção de objetos de design baseia-se em uma complexa rede de conhecimentos com o objetivo de atender às necessidades humanas. Portanto, a concepção de objetos perpassa por aspectos culturais e sócio-econômicos; viabilidade técnica; exigências de utilidade e durabilidade; facilidade de fabricação, reprodução, manutenção e reposição; economia de materiais; além da discussão da atribuição de valores e funções simbólicas, educativas, estéticas e éticas.

Percebe-se, então, que:

"a abrangência do design não se dá apenas no produto acabado, mas em todo o processo, desde a concepção do produto, tendências futuras, modo de vida, costumes, novas crenças, que o mundo em constante mudança e evolução exige, para o desenvolvimento do homem, em sua total complexidade." (Giustina, 2001)

Acreditamos ser o design, uma forma de avaliação da capacidade criativa e intelectual de um povo, ferramenta para a identidade de um país através da sua produção industrial e da sua cultura material.

Sendo assim, faz-se importante perceber o design é abrangente e transita da exatidão das engenharias à liberdade de expressão e criatividade das artes plásticas. Bonsiepe (1978) chama a atenção para o fato de que existe uma diferença fundamental entre Ciência e Arte. Segundo este autor, design não é nem será uma Ciência; não é nem será Arte, o que não exclui, entretanto, a existência de interações construtivas entre design e Arte e entre design e Ciência.

Segundo farias (2008), a relação entre design e Arte foi também discutida por Albert Alessi (1992), designer italiano de renome internacional, que tratou desta relação em contraponto não com a Ciência, mas com a tecnologia e o mercado. Segundo este autor, podem ser definidas duas abordagens principais para o design, diferentes e até certo ponto contraditórias. A primeira delas apresenta-o vinculado ao sistema industrial de produção em massa, como uma ferramenta de tecnologia e mercado. Esta visão restritiva do design relega-o ao plano de ferramenta tecnológica, que ajuda a indústria a produzir mais e ao plano do marketing, ajudando a indústria a vender mais. 

Por outro lado, dentro da segunda abordagem o design tende para a Arte e para a Poesia. Alessi diz que, em nossa sociedade, os objetos tornaram-se um importante canal de comunicação, através do qual os indivíduos expressam valores, status e personalidade. Cada vez mais as pessoas compram objetos pelo prazer intelectual ou espiritual. Objetos utilitários que incorporam Arte e Poesia não são usados, necessariamente, na sua função primária, mas para outros usos e por outras razões. O design, para Alessi, tende a tornar-se uma disciplina criativa global que propiciará o nascimento de objetos totalmente novos, de coisas destinadas a serem valorizadas de forma diferente do valor de uso ou de troca.

Mas para se atingir os consumidores, será necessário entender seus universos simbólicos, seus desejos e, principalmente, suas fantasias. O sucesso do produto será diretamente proporcional a uma maior capacidade do público de interagir com ele, no que é em grande parte orientado pelo design (Leite, 2004).

Infelizmente, hoje em dia, o design é associado a objetos caros, especiais, pouco práticos, divertidos com formas rebuscadas e gamas cromáticas chamativas. O design tem que ser menos um espetáculo para ser mais uma solução inteligente de problemas. 

Como exposto por Bonsiepe (2008) “a busca do equilíbrio ente os aspectos instrumentais operativos dos objetos técnicos e seus aspectos semânticos é a essência do trabalho do designer, sem privilegiar um lado sobre o outro”.

Conseguir a democratização do design permitindo a um amplo setor da população o acesso aos produtos para a vida cotidiana em seus diferentes domínios: saúde, casa, educação, esportes, transporte, trabalho, para mencionar alguns é papel dos designers de hoje.

Espera-se assim criar um mundo melhor.

Referências Bibiográficas:
ALESSI, A. “Design and Poetry". In: Object and Image. Helsink UIAH: University of Industrial Arts, 1992.
ARGAN, Giulio Carlo. Projeto e destino. São Paulo: Editora Ática, 2000.
BAUDRILLARD, Jean. O sistema dos objetos. São Paulo: Perspectiva, 1973.
BONSIEPE, G. Diseño Industrial. Madri: Alberto Corazón Editor, 1978.
BONSIEPE, G. Design e democracia. Acesso em julho de 2008, disponível em: http://www.agitprop.com.br/ensaios_det.php?codeps=MTM=
FARIAS, J Paulo S. Textos sobre teoria de design. Pequena digressão sobre natureza e conceito de design. Acesso em janeiro de 2008, disponível em: 
http://br.geocities.com/paulo_w_designer/DESIGN.htm#PEQUENA%20DIGRESSÃO%20SOBRE%20NATUREZA%20E%20CONCEITO%20DE%20DESIGN
GIUSTINA, Mara Della. As madeiras alternativas como opção ecológica para o mobiliário brasileiro. Florianópolis: EPUFSC, 2001. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001.
LEITE, Ricardo. Ver é compreender: Design Como Ferramenta Estratégica de Negócio. Rio de Janeiro: Editora SENAC Rio, 2004.
MUSTIENES, Carlos. 1000 Extra/ordinaries objects. Taschen, 2000.
REDIG, Joaquim. Sobre o Desenho Industrial. Rio de Janeiro: ESDI/UERJ, 1977. p.35.
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